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12.9.12

Exaustores e portas abertas ou as paredes têm de facto ouvidos ou ser meu vizinho

Ser meu vizinho é, no seu todo, uma alegria. Emoção diária, cenas dignas de “tenovela” (ouvi esta palavra all summer long em qualquer uma das praias onde estive, descobrindo assim o que os portugueses fazem, na sua maioria, após um dia de praia. Casa-banho-jantar e, ah deleite, ver a “tenovela” – Rápido! Rápido! Gritavam famílias inteiras à saída da praia!).

Pois os meus vizinhos são uns privilegiados. Têm-me. Não precisam de mais nada.

De manhã, já no hall da minha casa, tudo aos gritos! Calça-te! Pára com isso! Despachem-se! De rabo espetado a calçar miúdas, a discutir incumprimento diário de horários de alvorada com o marido. Para a próxima acorda mais cedo! Se não demorasses tanto tempo na casa de banho! E tu? E tu? E tu? E eu? E eu? E eu? Aaaaargggggggggg! Grrrrrrrrrrrrrr! Porraaaaaaaa! Despacheeeeeeeeeeeem-se, eu vou-me passar não tardaaaaaaa naaaaaaa/(&)%/&%/da! E é quando me viro, que noto que alguém, provavelmente um dos pequenos seres que habitam lá em casa, já fez o enorme favor de abrir a porta, e especado está o vizinho, que por uma qualquer razão que não me interessa, não tem filhos, portanto não sabe (PESSOAS COM FILHOS=PESSOAS QUE SABEM, PESSOAS SEM FILHOS=PESSOAS QUE NÃO SABEM, há um antes e um depois de ter filhos, ou se sabe ou não se sabe, o meu vizinho não sabe!). Especado, e eu a morrer de vergonha! Digam Bom dia meninas! Só dizem se quiserem e eu não insisto, cabisbaixa que vou até ao piso -2, a torcer para que o vizinho não me perceba despenteada, vestida às 3 pancadas, que aguente a viagem com todos nós, mais as lancheiras em cima dele, pessoa perfumada, engomada e penteada! Isto até uma sorte porque às vezes calha cruzarmo-nos com a vizinha da frente e tudo piora para o meu lado, BURACO! BURACO! A minha vizinha da frente é a PESSOA QUE SABE, que por uma qualquer razão metafísica, está sempre gira e alta e loira e perfumada e engomada e sua criança imaculada no seu “ovo” cor de rosa e o seu marido prestável e sempre sorridente, pois que cruzar-me com esta família é o suplício! Tenho a sensação de que sou um balão, que apertamos e apertamos, vai-se deformando e PUM!

À tarde, quando calha estar em casa, aproveito para adiantar coisas, normalmente calço-me e visto-me com roupa confortável, e não são poucas as vezes que tenho mesmo que ir à arrecadação, no piso -2, e penso sempre mudar de “outfit”, depois penso, para quê? Só com muito azar vou encontrar alguém a meio do dia no elevador! Ah mas isso era se eu não fosse eu! É incrível, não só encontro gente, como encontro para cima, para baixo, em vários pisos, a vizinha da frente sempre gira e alta e loira e perfumada e engomada aparece! Encolho! O palerma do 2º andar que fuma no elevador aparece! E eu que lhe dizia umas boas, mas resta-me recolher um pé com chinelo e entreter-me a coçar a perna, se é para parecer descabelada e “Féllinica” então tenho direito a tudo! As empregadas da limpeza com farda de trabalho aparecem! Olha agora se aparecer alguém parece que faço parte da equipa, até não é mau de todo! O vizinho giro lá de uns andares de cima aparece, a meio pára o elevador e entra a sua gira mulher, outra perfumada! Oh sorte marreca! É por estas por outras que o país está em crise, NÃO SE TRABALHA? /&%%&/(&/(&(&//(FGTRt*!

À noite, com a barriga encostada ao fogão a fazer o jantar, oiço os vizinhos de baixo através do exaustor, se quisesse ouvia com pormenor, muitas vezes aumento a potência do exaustor porque estou-me nas tintas para o que dizem! Até porque tenho bastante com que me entreter! Venham para a mesa! Venham! Quantas vezes é preciso chamar? Hã? Venhaaaaaam jáa! Comaaaaaaaaam! Não mexas no cabelo com as mãos sujas! Não mexas no cabelo da tua irmã com as mãos sujas! Páaaaaaara! Porraaaaaaaaaaaaa! Olhó prato! Aiiiiiiiiiiiii! Que raivaaaaaaaaa! Quem é que mandou mexer no prato da tua irmãaaaaaa? Tudo no chão!!! TUDO NO CHÃO! Eu passo-meeeeeee! EU dou-vos palmadas não tarda naaaaaada! PORRAAAAAAAAAA PÁAAAAAAAA! Não queres comer não cooooooomas! PUM prato da sopa a voar para o lava loiças, porque uma mãe às vezes passa-se à séria! Espera lá, se eu oiço o que os vizinhos de baixo dizem, com todas as letras, ups, o que pensará de mim a criatura de cima? Resta-me a esperança na humanidade, talvez aumente a potência do exaustor… talvez!

De madrugada, nem vale a pena falar, os gritos que dou atrás dos gatos, criaturas do diabo, são suficientes para a confirmação do meu diagnóstico!

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